terça-feira, 28 de junho de 2016

NINGUÉM É MAÇOM, SOMOS RECONHECIDOS COMO TAL


César Luís Bueno Gonçalves
Revista Universo Maçônico de 15 de junho de 2010

Um dos grandes dilemas maçônicos é saber se podemos nos intitular maçons (Sou maçom!) ou se essa afirmativa não nos pertence e só pode ser feita por um outro maçom.
De fato, temos uma visão míope de nós mesmos. Tendemos a uma hipervalorização do nosso eu e, não raras vezes, em detrimento do outro… Explico melhor, fomos educados em um sistema de comparações em que um ponto geralmente é explicado ou visto em relação a outro. Tendemos ao comparativo e assim nos sentimos mais ricos quando vemos mais pobres, sentimo-nos mais bonitos quando vemos mais feios e assim por diante.
Ocorre que por vezes nossa miopia egocêntrica é tão grande que nos assustamos com nós mesmos ao vermos nossa imagem refletida em um espelho. Tendemos a não acreditar no que vemos… não é possível que seja eu…
Mas por vezes forçamos a barra e influímos na imagem do espelho, ou pelo menos no que ela está nos revelando. O feio se torna belo e assim por diante.
Assim, ao nos considerarmos maçons, em detrimento de sermos reconhecidos como tal, chamamos para nós um conjunto de características do “ser maçom” que muitas vezes não apresentamos, não temos.
Claro, sempre se pode invocar o formalismo. Sou maçom porque fui iniciado. Sou maçom porque pertenço à obediência tal… e etc. … Mas isso realmente nos confere a autoridade para nos denominarmos maçons?
O que é ser maçom ??? É somente ter sido iniciado ??? Não implica mais nada ???
Desde meus tempos de aprendiz escuto um trocadilho muito usual em nosso meio, principalmente quando não gostamos de um determinado Irmão: “fulano é um profano de avental” ou então, quando encontramos qualidades em um não iniciado: “é um maçom sem avental”…
Por certo ser maçom implica muito mais que ter passado por uma iniciação.
Também reverbera em meu pensamento uma frase muito pronunciada em iniciações: “bem-vindo meu Irmão; esperamos agora que assim como você entrou para a Maçonaria que deixe que essa entre em você, em seu coração e atitudes…”
Minha angústia, que motiva essa reflexão sobre SER MAÇOM, é a inépcia de nossos métodos “maçônicos” em muitos de nós. Não raro vemos Irmãos colados no grau de mestre, mestres instalados e, até no grau 33º, com exposições diametralmente opostas à nossa filosofia, com atitudes antagônicas ao que se desprende de nossas alegorias e símbolos.
Bem sei que deveria estar preocupado acima de tudo com a minha pedra bruta, evitando de reparar nas imperfeições de outras pedras, mas isso está se tornando impossível para mim, pelo que peço humildes desculpas aos meus Irmãos, mas não dá para “tapar o sol com a peneira”, empresto aqui voz há muitos que têm se chocado com palavras e atitudes de outros Irmãos.
Abate-me extremamente estar ao lado de Irmãos que acham que o cume de seus progressos na Maçonaria são os graus colados… ser grau 33º em seu rito, ser mestre “instalado”, estar autoridade maçônica e assim por diante e, deixam a humildade, a fraternidade, o carinho e virtudes trancados no armário, o armário da arrogância e da empáfia.
Abate-me saber que Irmãos são indiciados civil ou criminalmente pelos mais variados delitos ou crimes.
Abate-me ter conhecimento de Irmãos que batem em suas esposas, filhos e familiares.
Abatem-me as disputas para saber quem é mais maçom, quem tem o maior grau… quem foi melhor Venerável Mestre.
Não consigo entender também como alguns insistem em trazer o pior de suas práticas profissionais para o seio das Lojas. Estive em Lojas onde me senti como em um tribunal de justiça, onde se fazia de tudo menos aquela egrégora gostosa de estar entre Irmãos. Todas as palavras eram medidas com cuidado, os pronunciamentos eram cheios de erudição jurídica, menos maçônica. A sessão travava com os famigerados “pela ordem Venerável”.
E o que falar dos Irmãos entendidos em política. Raro é os ver apresentando um trabalho sobre alegoria ou simbolismo maçônico… a tônica é uma só: política.
Voltamos então ao fulcro desta reflexão: sou maçom ou sou reconhecido como tal ? O que significa ser reconhecido como maçom?
O que ou quem é o maçom? Há algo que o diferencia de outro ente?
Se nos orientarmos pelos rituais e pela literatura maçônica teremos uma visão superidealizada do SER MAÇOM. Ele mais se parece com um super-homem, dotado de poderes extraordinários. Mas no convívio, no dia a dia, se desfaz essa visão do super-homem. Eu pelo menos nunca o encontrei entre nós, pelo menos não na forma idealizada. Muito menos em mim mesmo…
Está mais do que na hora de nos despirmos do modus profano. De tirarmos as nossas máscaras e darmos um passo em direção ao autêntico “ser maçom”. Está na hora de sermos maçons.
Reconheça que você não é o centro do universo!
Reconheça que outros podem vivenciar mais a maçonaria do que você!
Reconheça que graus de nada servem se seu coração e atitudes não passaram daquelas do grau 1 (pedra bruta)!
Reconheça que ser Mestre Instalado não lhe dá direitos acima de seus Irmãos!
Reconheça que tem pesquisado, estudado e refletido muito pouco em nossos símbolos, alegorias e ritualística!
Reconheça que tem faltado às sessões porque se acha melhor que aqueles que estão sempre lá, gostando ou não, ajudando nos trabalhos em Loja.
Reconheça que se é verdade que Maçonaria não se faz somente em Loja, também o é verdade que sem estar em Loja não se faz Maçonaria! É na Loja que exercitamos o submeter minhas vontades e fazer novos progressos na maçonaria. Não se iluda.
Reconheça que a Maçonaria não é clube social, partido político, confraria da cerveja ou o quintal de sua casa, terraço de seu apartamento, sala de seu trabalho, mas uma Ordem INICIÁTICA.
Reconheça, por fim, que você não é dono da Loja.
Deixe que as alegorias e símbolos tomem forma em seu interior e se manifestem em suas atitudes, não em meras palavras.
Deixe que o movimento da egrégora maçônica lhe tome a mente, o coração.
Deixe que a humildade aflore em suas palavras e ações. Não tema, pode baixar a guarda, você está entre Irmãos.

Por fim, receba seu prêmio, não é um avental mais bonito que o dos outros Irmãos ou um título de MI ou 33º mas, tão somente uma ação: você é reconhecido como tal, sem sombras de dúvidas!

sexta-feira, 17 de junho de 2016

A MAÇONARIA NA ÓTICA DE UM COMPANHEIRO MAÇOM



“Somente o homem, dentre todas as criaturas, pode mudar sua própria vida.
A maior descoberta dessa geração é que o ser humano, mudando as atitudes internas e sua mente, pode mudar os aspectos externos de sua vida!”
William James (1842-1910)





Muito, e há muito tempo se fala em Maçonaria. No mundo profano, a história, dependendo do ponto de vista do historiador propõe grandes feitos e épicos acontecimentos creditados a Maçonaria. Já outros, não tão lisonjeiros com a Ordem, a ela creditam as maiores atrocidades e despautérios. Mas então, seria a necessidade de ter sido uma sociedade secreta em alguns momentos, ou estar formada por pessoas ligadas a outras instituições ou mesmo outras ordens que necessitavam manterem-se no anonimato? Difícil identificar tais razões ou mesmo motivos. Hoje com os contratos constitutivos registrados nos respectivos órgãos de controle, a condição de secreta não se adéqua, mas permanece o segredo que tanto atrai as pessoas.
Creio ser importante a referência do contido no Preâmbulo da Maçonaria e como o próprio ritual apregoa, “A ser lido e explicado em Loja, frequentemente” (2013 p. 85). “A Ordem Maçônica é uma associação de homens esclarecidos e virtuosos que se consideram Irmãos entre si e cujo fim é viver em perfeita igualdade, intimamente ligados por laços de recíproca estima, confiança e amizade, estimulando-se, uns aos outros, na prática da virtude.” Manual de Procedimentos Ritualísticos e Ritual de Instruções do Grau de Aprendiz Maçom do REAA (2013 p.85).
Não menos importante o proposto no Escopo do Grau de Companheiro-Maçom que exalta: “se a Liberdade é o ideal do Aprendiz, que aspira a Luz, a Igualdade é o do Companheiro, para que possa solidificar os sentimentos de Fraternidade.” Ritual e Instruções Grau de Companheiro Maçom. (2004-2007 p. 9)
Segundo Rizzardo da Camino (2013, p. 43) “Três são as imposições da jornada em direção ao Companheirismo: Trabalho, Ciência e Virtude”, dessa forma iniciamos a caminhada do segundo grau, o de Companheiro Maçom.
Ainda engatinhando na Ordem, mas com caráter forjado por uma boa educação de família, escolas de excelente nível de ensino e oportunidades que se mostraram e se mostram ao longo de uma existência baseada principalmente em cinco pequenos conceitos que, a meu juízo, fazem a diferença:
·         Respeito: sentimento que leva a tratar alguém ou alguma coisa com grande atenção, profunda deferência, consideração ou reverência.
·         Disciplina: é o laço moral que liga entre si os diversos graus da hierarquia, nasce da dedicação pelo dever e consiste na estrita e pontual observância das leis e regulamentos.
·         Liberdade: constitui um direito natural do ser humano, proveniente da liberdade absoluta, praticada em seu estado de natureza que, paulatinamente, evoluiu para o estado civil, regido pelo contrato social idealizado por Thomas Hobbes (1588-1679), contemplando a vontade da maioria.
·         Igualdade: é a relação direta com os direitos fundamentais do cidadão e com a dignidade da pessoa humana, tendo como escopo o sentido de justiça, em estreita cumplicidade com os cânones do humanismo.
·         Fraternidade: tem características multifacetárias, de caráter permanente, abrangendo diversos aspectos da vida em sociedade. Uma palavra, um gesto, uma ação, a gratidão, o reconhecimento e o compartilhamento de ideias, dentre outras virtudes, são atos de fraternidade.
Ainda no grau 1, em consulta a um Mestre sobre por que não “praticávamos efetivamente a fraternidade”, a sábia resposta foi que: “a maçonaria prepara homens, não é um clube de serviços mas, que esses homens formarão tais clubes”.
Particularmente, trago do mundo profano a curiosidade do pesquisador pois, por muitos anos foi origem do meu sustento. Logo, fui procurar ler mais, estudar mais, aprender o sentido e o significado dos símbolos, das alegorias, da ritualística pra daí retirar os mais profundos ensinamentos visto ser a Maçonaria, além de um sistema de moral um filosofia social e espiritual.
De maneira em geral, no mundo profano, estamos vivendo uma época em que princípios básicos de moral e ética são simplesmente desconhecidos, ou destorcidos, ou deturpados, tendo em vista o colapso social que proporciona um aumento geométrico na violência, causado pela falta de oportunidade, pela impunidade e pelo exemplo de lideranças deformadas pelo vício da corrupção.
Diariamente erramos com pequenas falhas, e muitas vezes, procurando tirar uma vantagem ou da situação, ou de alguém ou de alguma coisa. Faz parte a índole do brasileiro alguns dizem. Certo ou errado o que é constatado, é que valores como respeito, disciplina, liberdade, igualdade e fraternidade entre outros são simplesmente desconhecidos e não estimulados nas gerações contemporâneas. Deformando assim o caráter do indivíduo que em algum momento vai assumir uma liderança e com tal deformação a conduzirá.
Assim, uma certa citação de Alexandre, o Grande, se mostra pertinente:
Quando, à beira da morte, Alexandre convocou os seus generais e relatou seus 3 últimos desejos:
Que seu caixão fosse transportado pelas mãos dos médicos da época;
Que fosse espalhado no caminho até seu túmulo os seus tesouros conquistados (prata, ouro, pedras preciosas...);
Que suas duas mãos fossem deixadas balançando no ar, fora do caixão, à vista de todos.
Um dos seus generais, admirado com esses desejos insólitos, perguntou a Alexandre quais as razões. Alexandre explicou:
Quero que os mais iminentes médicos carreguem meu caixão para mostrar que eles NÃO têm poder de cura perante a morte;
Quero que o chão seja coberto pelos meus tesouros para que as pessoas possam ver que os bens materiais aqui conquistados, aqui permanecem;
Quero que minhas mãos balancem ao vento para que as pessoas possam ver que de mãos vazias viemos. Alexandre, o Grande (356 a 323 a.e.c.)

Além de todo o desprendimento, Alexandre que segundo Plutarco, foi orientado na juventude por Aristóteles, desenvolvendo assim um particular e avançado raciocínio e uma preferência pelas ciências como a engenharia que está baseada na geometria. Na ótica de Da Camino, é uma das etapas a transpor pelo companheiro maçom “e cada uma simboliza uma parte da ciência, a saber: gramática, retórica, lógica, aritmética e geometria”. (2013, p.43)
Todas em geral e a geometria em particular, se nos mostra a arte de medir. É nesta etapa do desenvolvimento que o companheiro maçom inspirado na letra “G”, que representa a imagem da inteligência universal, desenvolve o conhecimento de medir todos os aspectos da natureza, pois esta é vital na principal construção que é o Templo Interior, símbolo da presença de LUZ em si mesmo, no seu corpo físico e mental, e consequentemente: espiritual.
Vários estudiosos se dedicaram ao estudo da Geometria e muitos acreditavam e procuraram comprovar a existência de um padrão ou proporção matemática, que na visão de Guimarães (2016) “implantada pelo Criador entre todas as coisas e fenômenos do Universo”. Assim como os gregos ao estabelecerem o Número de Ouro ou a Divina Proporção que é 1,618. Já no século XV, Da Vinci em sua obra Homem Vitruviano, descreve uma figura masculina nua, separada e simultaneamente em duas posições sobrepostas sendo a medida da cabeça até a linha dos pés dividida pela medida do umbigo até a linha dos pés é igual ao número 1,618 também conhecido pela letra grega “Φ” (fi). Em alguns casos o desenho e o texto são chamados de Cânones das Proporções.
Se mostra claro a estreita ligação entre a Geometria e a Aritmética pois surge na visão de Da Camino (2013, p. 124) “por intermédio das joias depositadas no altar: compasso e esquadro auxiliadas pela régua”, é ela a responsável pela construção de toda obra edificada. E é tamanha a importância dessa ciência-arte que no segundo grau o maçom denomina o G.∙.A.∙.D.∙.U.∙., como o Grande Geômetra, analisando com profundidade a letra “G”.
Por outro lado, conforme Baigent “as instituições são tão virtuosas, ou culpadas quanto forem os indivíduos que as compõem”. (2013, p.17)
Se é aqui, em nossa ágora, que encontraremos a possibilidade de um desenvolvimento individual, de tal forma a nos tornarmos pessoas mais identificadas com a Liberdade, Igualdade e Fraternidade.
Sendo a Maçonaria é uma sociedade de homens livres e de bons costumes. E, que lapidar a Pedra Bruta tem como significado o desenvolvimento individual, o aprimoramento do Templo Interior, o despertar da Iluminação. Se a base que sustenta o edifício é a Tolerância para que Irmãos indistintamente se reconhecem como tal, não estará faltando sairmos da teoria e efetivamente praticarmos o que aprendemos e apregoamos na sua forma mais simples, no cotidiano de cada um?
Hoje, me identifico muito com a alegoria da escada em caracol, na qual um jovem, “tendo passado a adolescência como Aprendiz e a virilidade como Companheiro, tenta, ousadamente, avançar e subir, apesar do caminho tortuoso e a subida difícil, na esperança de, pela diligência e pela perseverança, chegar a idade madura como um Mestre esclarecido.” (GORGS, 2004-2007 p.66)


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAIGENT, Michael. O Templo e a Loja: o surgimento da maçonaria e a herança templária. 2ª Ed. São Paulo: Madras, 2013.
D’ELIA JUNIOR, Raymundo. Maçonaria 50 Instruções de Companheiro. São Paulo: Madras, 2015.
DA CAMINO, Rizzardo. Rito Escocês Antigo e Aceito. Grau 1º ao 33º. São Paulo: Madras, 2013.
GUIMARÃES, José Maurício - M.'.I.'. A.'.R.'.L.'.S.'. Inconfidência 47 – Grande Loja Maçônica de Minas Gerais, Brasil.
Blog disponível em: www.zmauricio.blogspot.com Acesso em 12/04/2016 23h30min.
MANUAL DE PROCEDIMENTOS Ritualísticos e Ritual e Instruções do Grau de Aprendiz Maçom do Rito Escocês Antigo e Aceito. Porto Alegre: GORGS, 2013.

RITUAL E INSTRUÇÕES do Grau de Aprendiz Maçom do Rito Escocês Antigo e Aceito. Porto Alegre: GORGS, 2004-2007.